quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O Porta Jóias de T’an-mo



Paulo é um homem bem sucedido, com a carreira em jornalismo televisivo em alta. Apresenta um telejornal em horário nobre numa emissora de maior audiência do país. Hoje era o seu primeiro dia das férias de um mês. Planejou uma viagem para Natal onde passaria as férias com sua esposa Catarina e sua queria filhinha Sofia.
Elas já estavam lá, num hotel cinco estrelas esperando por ele. Paulo tinha que resolver uma coisa antes. Sofia, sua filha, estava fazendo aniversário e precisava comprar algo bem bonito para ela, para não acontecer que nem no ano passado, em que ele lhe comprou uma Barbie e ela lhe disse que já estava grande o bastante para brincar de boneca.
Sabia da fome de música clássica de sua filha. Achava isso sensacional vindo de uma garota de 13 anos, pois outras da sua idade gostariam de algo mais moderno e “descolado”. Acha que esse gosto nasceu porque Catarina, sua mulher, colocava Mozart para Sofia antes de dormir. Ouviu dizer que as peças dele estimulam o cérebro, principalmente os de formação, no caso dos bebês.
Estava agora no Bairro da Liberdade e via o relógio de pulso constantemente, temendo perder o horário do próximo avião, que partirá daqui a 2 horas. Avista um koto – um instrumento musical de cordas oriental, semelhante a uma grande cítara – numa lojinha e logo vê que sua filha adorará esse instrumento.
A loja era pequena exteriormente, mas por dentro até que era espaçosa. Paulo analisa o koto e um carismático ancião oriental aproxima-se do rapaz.
- Gostou do instrumento senhor?
- Gostei. Acho que vou levar.
- Pelo senhor não ter nem perguntado o preço, farei um preço camarada pra você.
- Opa, preço camarada é comigo mesmo.
O senhor, contente por poder vender esse koto que estava empoeirando em sua loja, pega o instrumento para dar a saída com ele. Enquanto isso, outro objeto arrebata a atenção de Paulo. Um porta jóias bem delineado e com traços orientais muito bonitos. Abre-o para vê-lo por dentro e tem uma surpresa. Uma música harmoniosa oriental começou a tocar. Ficou fascinado por ela, despertando um sentimento quente em seu interior.
- Por favor senhor feche essa caixa!
Pelo susto, Paulo fecha o porta jóias e olha para o ancião que havia gritado com ele. O ancião leva a mão a testa e enxuga o suor súbito que brotou acima de seus olhos. Acalmando-se, o velho diz:
- Me desculpe senhor, é que minha filha morreu escutando essa música. Traz-me recordações...
O simpático ancião começa a lacrimejar e ficar trêmulo. Amava muito sua filha. Sensibilizado e até sentindo-se culpado por isso, Paulo fala:
- Eu não sabia senhor, me desculpe.
- Tudo bem, - responde o ancião – sou apenas um velho caquético. – recompondo-se, o senhor sorri ternamente e diz – já pode levar o koto agora.
Paulo volta a olhar para o porta jóias. Estava intrigado com ele e acredita que sua filha adorará isso; então ousa perguntar.
- Se não for muito inconveniente, esse porta jóias está à venda?
O ancião olha o objeto com um semblante de repugnância e responde-lhe:
- Não, não está a venda. Não posso vendê-lo.
Paulo fica desanimado, pagaria qualquer quantia para isso e iria oferecer, quando o ancião toma a frente na fala e diz:
- Posso dá-lo a você, como brinde por comprar o koto. Não quero lucrar com esse objeto... – respira profundamente, tentando conter o ódio que sentia desse artefato. O senhor reluta, mas sente que deveria avisá-lo disto – Esse porta jóias pertenceu a T’an-mo. Seu nome está gravado no fundo da caixa.
O jovem jornalista ri por dentro. Hoje certamente era o seu dia de sorte. Os dois senhores fecham negócio e Paulo sai carregando os dois presentes de sua filha. Ela ficará animadíssima.
O ancião fita o fundo de sua loja e sente o maior alivio de sua vida ao finalmente livrar-se do porta jóias maldito. Inconsolado, mergulha a face sobre a bancada, começando a chorar copiosamente.

O famoso jornalista Paulo Ferreira acaba de embarcar no avião, contente com as duas aquisições que conseguiu para a sua filha. Com certeza estava encantado com o porta jóias, ainda mais com sua música melodiosa com um tom misterioso. O estranho ancião não estava mais por perto para que o coitado sentisse a dor da perda, então ousa abrir o porta jóias e escutar toda a música. Seus olhos brilham de fascinação ao escutar novamente a música e olha-se no espelho que havia na tampa ao abrir. Sente um sentimento morno invadir seu peito e sua mente começa a mostrar seus desejos que queria naquele momento, olhando seu reflexo no espelho.
- Desejo uma ótima noite de sexo com minha mulher quando eu chegar.
Tais palavras escapam de sua boca sem que ele desse conta. A música acaba e toma um susto, pois via os outros passageiros olhando em sua direção. Percebe que na verdade fitavam devaneados para a caixa de música. Ao fechar a caixa, os passageiros olham para ele e Paulo percebe que deve ter falado alto aquelas palavras que saltaram de seus lábios. Como se nada tivesse acontecido, os demais passageiros voltam a fazer com o que estavam antes. Paulo mergulha seu corpo na poltrona e relaxa, tentando entender o seu devaneio. No mesmo instante aparece uma moça e senta-se ao seu lado. Uma mulher de pele negra e extremamente linda e de belas curvas.
- Vejo que o senhor é o meu companheiro de viagem. - diz a bela moça, acompanhada de um belo sorriso -.
Paulo senta-se melhor na poltrona e replica também com um sorriso:
- Me chamando de senhor eu me sinto um velho.
- Ai me desculpa, - diz a mulher, encabulada - é que eu fui criada assim, a sempre falar com uma pessoa o chamando de senhor ou senhora.
O carismático jornalista estica-lhe a palma da mão e diz:
- Sou Paulo Ferreira.
A mulher aperta a sua mão encantada e logo diz:
- Sabia que te conhecia de algum lugar, você é o Paulo Ferreira que apresenta o jornal das oito.
Paulo consente com a cabeça, sorrindo levemente. Ele odiava ser reconhecido, mas sendo por uma mulher tão atraente, isso não o abala muito. A moça fita-o admirada, enquanto que ele fica encabulado em ser encarado com tanta animação. A moça leva a mão à cabeça, notando a sua falta de memória.
- Me perdoe a indelicadeza, me chamo Heloísa.
O avião decola e no decorrer do trajeto Heloísa e Paulo conversam bastante, contando suas experiências profissionais e pessoais. Paulo descobre que Heloísa é modelo de uma grife internacional e está viajando para Natal para tirar as fotos da nova coleção de verão.
As horas passam e os dois nem percebem quando o avião pousa. Nisso as aeromoças os avisam e eles vão buscar suas bagagens no terminal.
- Me diverti muito com você Paulo.
- Eu também Heloísa, você é muito simpática.
- Obrigada.
Ambos fitam-se sem palavras e Heloísa querendo dizer o que estava entalado em sua garganta, toma coragem e fala:
- Pena que é casado, gostaria muito de poder almoçar um dia com você, para podermos conversar mais.
Paulo olha para sua aliança e ri abafadamente, dizendo:
- Isso não é problema, só iríamos conversar, não é?
- Certamente. - diz ela, também rindo -.
Ligando seu celular, Paulo lhe diz:
- Se me der seu número...
Desanimada, ela explica-lhe:
- Estarei cheia de trabalho nesses dias. A grife pega muito do meu tempo e não sei quando estarei livre.
Paulo consente com a cabeça, entendendo a situação profissional.
- Mas posso pegar o seu número e te ligar quando eu estiver livre.
- Tudo bem, mas às vezes deixo meu celular desligado, pois os toques me deixam irritados. Troco semanalmente os tons do meu celular. Se não for muito inconveniente, posso te passar meu e-mail também.
- Que isso, seria ótimo. Não saio da frente do meu laptop mesmo. Juntaremos o útil ao agradável.
Ambos riem e Paulo passa-lhe o número de seu celular e e-mail. Dentro do táxi que pegou, Paulo aprecia a vista dessa cidade maravilhosa. Lembra de ter conhecido Natal quando fez uma matéria sobre o carnaval de Macau, chamado "mela-mela", onde as pessoas seguem o trio elétrico e são lambuzadas em mel - uma coisa muito bonita de se ver, são sujas e saem felizes -.
O céu já estava escuro e apitava 23h02min em seu relógio. Mal via a hora de encontrar com sua filhota - como chamava carinhosamente sua filha - e sua mulher, com quem teve a sorte grande de casar.
Chega ao hotel onde elas já estavam e sobe até o quarto. Provavelmente as duas aproveitaram muito a praia que tem perto dali, já que alugou uma suíte próxima a uma. Sua filhota adora praia. Verifica o quarto de sua princesa e a vê empacotada no mundo dos sonhos. Não acredita que perdeu o aniversário de sua filhota. Não deixa por menos, ousa acordá-la. Ao vê-la abrir os olhos cansados ele coloca os presentes encima da cama e sorridente canta:
- Parabéns pra você,
Nessa data querida...
- Pai, você chegou! - diz a menina animada, abraçando-o -.
- Muitas felicidades,
Muitos anos de vida, eh...!
- São pra mim?! - pergunta animada -
- É claro querida, os dois.
Sofia analisa o koto e começa a dedilhá-lo, testando o som. Animada, abraça o pai, agradecendo-o. No mesmo instante ela fita admirada a caixa de músicas e torna a abri-la, entretanto não sai a música melodiosa que Paulo ouvira. Não sai nenhum som. Paulo pega o objeto em mãos e lamenta:
- Caramba, acho que quebrou. Esse porta jóias tocava uma música tão bonita.
Sofia sorri ternamente e fala:
- Tudo bem pai, o que vale é a intenção.
Satisfeito e orgulhoso com sua filha, beija-lhe a testa macia e a coloca para dormir. Pedindo que ela dê a devida atenção aos seus presentes amanhã, que terá bastante tempo. Sua obediente filha acata a ordem e põe-se a dormir.
Paulo caminha fatigado até seu quarto e vê sua linda mulher dormindo calmamente. Não ousaria acordá-la por nada nesse mundo, gostava de vê-la dormir tão confortavelmente que acha um pecado acordá-la. Tira a roupa que lhe pesava em seu corpo e coloca um pijama confortável, e deita-se ao lado dela. Um instante se passa e Catarina abraça-o por trás, beijando-o a nuca.
- Você demorou...
- Desculpe amor, te acordei?
- Só estava cochilando, não consegui parar de pensar em você...
Ele arrepia-se, pois sua mulher apalpa-lhe as genitálias e desce os centímetros da cama para lhe fazer um agrado. Paulo não iria dispensar um carinho desse e engaja-se no prazer.

No quarto de Sofia, o porta jóias toca sua música melodiosa, com sua tampa aberta...

Amanhece e Paulo acorda contente, beijando as costas de sua esposa. O sexo de ontem foi maravilhoso. Ela fez tudo o que ele queria sem que este o pedisse, estava impressionado. Levanta-se para pedir serviço de quarto e tomar um bom banho.
Após tomarem café da manhã, suas duas rainhas o mostram a praia maravilhosa que havia próximo ao hotel. Sofia mostrou-lhe o porta jóias e ele estava tocando novamente. Ela gostou muito da música e resolveu levar o porta jóias para guardar dentro dela as conchinhas que achasse na orla da praia. O lugar era praticamente desolado, apenas poucas pessoas estavam no lugar. Paulo acha perfeito. Um lugar bem sossegado.
Estendem o guarda-sol e Sofia vai nadar um pouco, enquanto que Paulo passava bronzeador em Catarina.
- Essas férias não podiam ser melhores, estou adorando. - declara Catarina -
- Eu também, a noite de ontem foi maravilhosa.
Catarina sorri e vendo o porta jóias que seu marido deu a sua filha, pega em mão e analisa-o.
- Lindo porta jóias.
- Você achou? Espere até você abrí-lo.
Catarina abre o porta jóias e fica encantada com a música e devaneadamente torna a olhar-se pelo espelho do objeto.
- Não é lindo?
Ignorando tudo a sua volta por estar hipnotizada pela música e seu reflexo, ela sussurra:
- Queria ser amada de verdade...
- O que disse querida? - indaga Paulo, estranhando-a -.
Um grito súbito arrebata a atenção dos dois. Era de sua filha Sofia, que ao longe se arrastava pela areia. Os dois correm apavorados e vêem um casal socorrendo a criança. O homem que a socorreu olha para os pais em corrida e clama:
- Ela precisa ir ao hospital, ela foi ferroada por uma arraia.
A ferroada podia ser vista no calcanhar da garota, que ficou arroxeada e ela gritava muito de dor. Paulo a pega no colo e pede para Catarina ligar para um hospital. O homem, querendo ajudar, diz:
- Posso levá-los de carro, ele está estacionado perto daqui.
- Isso, - diz a esposa do homem - a ambulância vai demorar a chegar.
Sensibilizada com a caridade do casal, Catarina agradece, emocionada. Sem demasiada demora, eles seguem para o carro do casal e vão para o hospital.
Na chegada, os médicos colocam Sofia na emergência. O homem que os ajudou nada mais é que um médico desse hospital que coincidentemente estava de férias e tomou conta para que Sofia fosse bem cuidada. Seu nome era Maycon e o de sua mulher era Denise. Paulo e Catarina agradecem-lhes pela ajuda.
- Que isso, não foi nada. - diz Maycon - é o meu dever.
- Mas agradecemos mesmo assim Dr. Maycon, nossa filha é muito preciosa para nós. - insiste Catarina -
- Me chame apenas de Maycon, tudo bem? O Dr. está de férias.
Catarina consente com a cabeça agradecendo-o. Paulo não queria ser mal-agradecido, mas sua filha era mais importante.
- E como minha filha vai ficar?
Maycon arqueia as sobrancelhas num tom preocupado e diz:
- Vou ser franco com vocês, ela não está nada bem.
Paulo agarra-lhe pela camisa e nervoso fala:
- Como não está nada bem?! Foi só uma arraia droga!
Catarina intervém sobre o marido e o faz largar o homem que os ajudou.
- Que isso Paulo, ele não tem culpa de nossa filha estar assim!
O jornalista analisa o bom senso e pede desculpas ao jovem médico.
- Tudo bem Sr. Paulo, é uma situação delicada e não posso culpá-lo por estar aflito.
Denise aproxima-se de Paulo e Catarina e diz:
- A arraia pode parecer uma criatura inofensiva e até que ela é; só ataca quando está acuada, como forma de defesa. Muitas pessoas pisam sem querer em arraias por que elas se camuflam sobre a areia e a criatura acaba ferroando.
- Denise sabe o que fala, ela é bióloga marinha. - acrescenta Maycon - E o caso é que Sofia, coincidentemente é alérgica a ferroada de arraia nos exames que fizemos, por isso que ela passa tão mal.
- Óh meu Deus, minha filhinha vai morrer! - diz Catarina, levando as mãos ao rosto em prantos -.
- Não fale besteiras mulher! Nossa Sofia não vai morrer, não vai morrer, entendeu?! - diz Paulo, segurando-a pelos ombros -.
Maycon é chamado para ver o caso da menina por um interno e ele vai. Denise senta-se ao lado de Catarina e consola-a com um ombro amigo, enquanto que Paulo senta-se ao lado das duas, fitando o porta jóias que trouxe consigo. Olhando o artefato lembra do sorriso de sua criança ao vê-lo, não queria guardar uma memória semelhante ao que o dono da loja teve com sua filha. Abre a caixa e escuta a melodia. O mesmo transe apossa-se de sua mente e inconscientemente já estava olhando-se pelo reflexo e seus lábios proferem:
- Desejo que minha filha saía sem complicações...
Maycon estava na U.T. I vendo o caso de Sofia. Seu corpo não estava resistindo ao veneno e sua pulsação estava fraca. Rapidamente seus batimentos chegam ao zero. O médico em férias prepara o desfibrilador para tentar ressuscitar a menina. Passa o gel e tira o biquíni dela, preparando-se para o ato, quando milagrosamente, os olhos da menina se abrem e sua pulsação estabiliza. Fica pasmo com a situação e ao vê-la tentar levantar-se da cama de hospital, ele a impede, dizendo que ainda pode ter uma recaída.
- Não, eu estou bem.
Sofia salta da cama colocando seu biquíni, como se nada tivesse acontecido. Incrivelmente o arroxeado da ferroada havia desaparecido em seu calcanhar, porém seu semblante estava muito sério e seus olhos estavam vazios como um buraco negro. Sem mais, a menina começa a caminhar pelo corredor e bestificados, Maycon e os enfermeiros que o ajudavam começam a segui-la. Cheios de dúvidas.

Paulo fecha a caixa e nota algo familiar, as pessoas à volta estavam olhando fixamente para a caixa, como se estivessem em transe. Até sua esposa parara de chorar para fitar o objeto, junto de sua nova amiga Denise. E como acontecera no avião, depois que a música acaba, todos voltam a fazer o que faziam. Catarina volta a chorar, Denise a dar-lhe ombro, as balconistas analisando as fichas...
No mesmo instante as luzes oscilam e dá uma queda de energia, deixando todo mundo na escuridão. Os médicos ficam loucos com isso, pois no andar de cima existem pessoas respirando por aparelhos, e não são poucas. Ficam loucos mesmo porque no hospital - particular - tem gerador, para evitar esse inconveniente, só que a maquinaria não queria funcionar e não havia nada de errado com ela. Acontece uma grande correria para socorrer os internados em estado grave. Paulo e Catarina ficam mais aflitos com o bem de sua filha, quando seus corações são agraciados pela imagem de sua princesa, andando como se nada tivesse acontecido. Os pais abraçam-na como se nunca mais tivessem a visto.
- Oh filhota você está bem, graças a Deus! - declara Paulo, aliviado -.
- Que bom filhinha...
- Que isso gente, estão me fazendo passar vergonha.
Os pais mimam a garota, enquanto que a energia volta devido ao gerador que volta a funcionar. Paulo e Catarina vêem Maycon e agradecem-no por cuidar de sua filha. O médico pasmo com a melhora repentina da garota apenas aceita os elogios da família. Paulo propõe-se a pagar pelos honorários do tratamento, não aceitando recusa. Catarina sentira um vinculo forte com Denise e as duas pegaram o número de telefone uma da outra. Satisfeitos com a melhora de sua pequenina, os dois saem do hospital.
Um interno do hospital conversa com outro e Maycon capta a conversa sem querer:
- A porcaria do apagão matou três das pessoas que respiravam com ajuda dos aparelhos. Lamentável...

Passam três dias depois do susto. Catarina e Denise concretizaram uma forte amizade. A única coisa boa que ocorreu com a situação desastrosa. Sofia já estava bem melhor, sem nenhuma recaída. Agora estava em seu quarto tentando aprender a tocar o koto. Catarina estava na casa de Denise, uma mansão perto do hotel. Paulo preferiu ficar no hotel pesquisando um tema muito interessante. "T'an-mo"...
Acha estranho, pois na pesquisa que fez pela internet viu que T'an-mo é uma criatura folclórica chinesa que realiza desejos. O estranho ancião disse que esse porta-jóias pertenceu a T'an-mo. Analisa que deve ter sido um Zé ninguém na China para não constatar na internet ou o velho está caduco em se referir a um demônio chinês. "Invencionice Cultural" como falava o próprio Paulo. Mas que existe uma coisa muito estranha nesse porta-jóias ele não pode negar. Fita o artefato bem a sua frente, onde estava repousada sobre a escrivaninha. De repente ocorre um apito no computador. Seu correio eletrônico avisa-lhe que uma nova mensagem lhe foi enviada.
"Oi Paulo, tudo bem? Estou livre amanhã, então podemos marcar aquele jantar, que tal? :)"
"Ligue para o celular abaixo e então marcamos. Beijinhos, beijinhos, tchau, tchau... ;)"
Paulo fica contente e liga para ela no mesmo instante, marcando o encontro. Encara o porta-jóias e ousa brincar com ele. Abre-o e escuta a música melodiosa, olhando para seu reflexo no espelho.
- Desejo transar com a Heloísa.
No mesmo instante a música cessa. Paulo sempre acha isso estranho. Sempre quando fala alguma coisa ao se olhar no espelho a música pára. Fecha-a e a deixa de lado, começando a rir do "poder" de "T'an-mo". O mestre dos desejos...
O dia chega e ele tem um encontro agradável com Heloísa, que descobriu ser mais simpática do que já a achava - e mais sensual do que antes -. Ele a acompanha até o hotel em que ela estava hospedada e os dois ficam em frente, encarando-se sem jeito.
- Então; acho que é minha hora. - diz Paulo -
- Bem... - fala Heloísa, um tanto sem jeito - Iria te convidar para entrar para você ver o meu primeiro book de que te falei, mas já que tem que ir embora...
- Não, por mim tudo bem, eu adoraria. Só pensei que você fosse querer descansar, então...
- Já que você pode, então vamos entrar logo.
Paulo consente e entra com ela, pegando o elevador. Chegando ao andar, os dois saem do elevador aos beijos e amassos, chegando até a suíte de Heloísa que era bem em frente ao elevador. Ela abre a porta com Paulo a beijá-la copiosamente na nuca e costas e os dois entram aos beijos voluptuosos. Não esquecendo de fechar a porta. Logo, os dois caem na cama, ainda beijando-se loucamente.
- Tem camisinha? - pergunta Paulo, afoito -.
- Claro que tenho bobinho, sou modelo.
Ela abre a gaveta do criado mudo e pega uma das camisinhas espalhadas e entrega a Paulo. Querendo provocá-la, ele diz:
- Esse é o seu book?
- Cala a boca e vem logo, ou me lembro que é casado e me arrependa disso.
No mesmo instante Paulo pula em Heloísa e os dois aproveitam a diversão...

Após o momento que os dois tiveram Heloísa não se sentiu bem por ter feito com que Paulo traísse sua mulher e o pede que não mais a procure. Paulo fica um tanto sem jeito com a situação também. Nunca traiu sua mulher na vida. Heloísa era excessivamente atraente, mas não era para ele ter feito isso. Nunca fez mesmo com mulheres com os mesmos atributos dessa simpática modelo.
Paulo concorda em não vê-la mais. Para o bem dos dois. Sai da suíte dela e segue para casa. Nisso, Catarina esperava-o, pois já era quase de madrugada e seu marido ainda não chegara. Tinha um assunto muito sério a tratar com ele.
Até que ele chega e depara-se com sua mulher a sua espera. Ao refúgio das sombras, com a pequena luminosidade de um abajur. Paulo olha para seu relógio de pulso e vê que já é meia-noite, sendo que saiu às sete da tarde. Sabia que estaria encrencado então prepara o seu cinismo jornalístico.
- Olá amor. Por que ainda está acordada?
- Não sei, deve ser porque estamos de férias e devo aproveitar ao máximo.
Paulo sabia. Quando Catarina estava irônica era porque está muito zangada. Ele tenta beija-la, mas ela levanta-se do sofá, esquivando da investida e logo saca uma folha de papel, lendo-a em voz alta:
- “Oi Paulo, tudo bem? Estou livre amanhã, então podemos marcar aquele jantar, que tal?” Depois vêm um sorrisinho com dois pontos e parênteses e na outra linha: "Ligue para o celular abaixo e então marcamos. Beijinhos, beijinhos, tchau, tchau.” Reticências, ponto e vírgula, parênteses, simbolizando um smiley sorrindo e piscando.
Ele fica mais branco que a celulose que Catarina empunhava. Não entende como ela conseguiu isso, mas tinha que ser cínico até onde dava.
- O que é isso? – fala ele, com naturalidade. Com uma calma como se nunca tivesse visto isso –
Com o mesmo sarcasmo de antes, ela responde-lhe:
- Vi isso no seu e-mail aberto. Achei muito interessante e resolvi imprimir para poder mostrar pra você. – ela volta a olhar para o papel e diz – Muito simpática essa Heloísa, e muito bonita também. Vi algumas fotos do book dela, olha só.
Catarina tira do bolso outro papel, em que estavam algumas fotos minimizadas do book de Heloísa.
- Consegui na empresa que a gerencia. Eles têm que deixar o book no site para que alguma grife ou estilista possa ver as suas garotas.
Paulo fica estarrecido. Tinha certeza absoluta que desligou o computador antes de sair e que excluiu esse recado até da lixeira. Dizer mentiras não o ajudaria nesse instante, muito menos a verdade. Pioraria ainda mais.
- A conheci no aeroporto e só fomos jantar...
- Não precisa me explicar Paulo. – diz Catarina – Só quero que cumpra com a promessa que fizemos a nossa filha. Que passaríamos às férias em família. Nosso casamento sempre foi uma farsa, você sempre amou e ama outra mulher, mas devo te lembrar que temos uma filha e que por isso, por enquanto, viveremos como uma família... Depois dessas férias, tomamos nosso próprio rumo.
Catarina segue chateada para o quarto e Paulo a segue, tentando convence-la de que não era verdade.

Paulo acorda de manhã, no sofá. O mínimo que conseguiu foi uma forte dor de cabeça por ficar a madrugada inteira conversando com Catarina, que sempre lhe dava respostas ferinas com um sarcasmo escancarado. Dormiu na sala para não começarem a discutir feio e acordar sua filha.
Põe-se a matutar. Conseguiu uma noite maravilhosa com Heloísa, como havia pedido ao porta jóias. Como também, no aeroporto, pediu que tivesse uma noite de sexo com sua esposa e conseguiu. Essas duas coisas - acredita ele - eram inevitáveis. Com certeza sua mulher iria ter uma noite com ele e no caso de Heloísa, teve uma química muito forte que os dois não puderam resistir. Apenas o caso de sua filha era o que o deixava intrigado. O Dr. Maycon disse que a recuperação de Sofia foi muito estranha. Ele disse que o coração dela parou e perdeu a pulsação. Subitamente ela levantou-se da cama como se nada tivesse acontecido e pôs-se a andar.
Também percebeu que ocorreram coisas estranhas através das boas, mas crê que sejam apenas coincidências. Resolve ver sua adorada filhota, enquanto ela dormia. Admira-a da porta, seu doce rostinho angelical dormindo que nem um querubim.
Paulo sai um pouco, carregando o porta jóias. Mais parecia que ele comprou o presente para si próprio do que para sua filha, mas esse artefato estava intrigando-o muito. Pára num restaurante simples e pede um café para acompanhar a leitura sobre T’an-mo que imprimira do site. Entretanto não conseguia encontrar nada sobre esse porta jóias. Estava completamente perdido. Pensa que o único modo de testar esse “poder” será seguindo os passos.
Abre o porta jóias e a música penetra nos ouvidos de todas as pessoas ao redor. Paulo fez questão de observar todas as pessoas em volta e como esperado, estavam hipnotizadas pela música. Ele mesmo resistia para não ser hipnotizado pela música. Esse som deve atingir a região neural que controla os sentidos. Entretanto tinha que testar o porta jóias. Olha para o espelho e faz o teste:
- Desejo que meu café saia por conta da casa.
De imediato a melodia cessa e subitamente, uma garçonete que estava distraída pela música derrama todo o conteúdo da bandeja que carregava encima de Paulo. No mesmo instante ele levanta-se e tentar conter a ardência que os líquidos quentes estavam lhe fazendo. A garota pede mil desculpas por isso e Paul tenta acalma-la dizendo que não foi nada. Um homem vem logo para acudi-lo e lhe diz:
- Me perdoe senhor, ela é nova aqui. E pelo que vejo muito desastrada.
- Isso acontece não se preocupe.
Por mais que dissesse isso, não era o que sua pele assada lhe dizia. O homem olha para a mesa em que Paulo estava e lhe diz:
- Para compensá-lo o café fica por conta da casa.
Paulo fita-o assustado e logo vê que a música volta a tocar. Todos voltam à atenção para a música e esquecem de sua realidade. O dono do restaurante, a garçonete e os demais. Todos de olho no porta jóias. Um tanto temeroso Paulo pega o porta jóias e sai do recinto.
As pessoas voltam ao normal e ao que estavam fazendo. O dono do restaurante olha a pobre garçonete com seus olhos fulminantes e soando baixo, diz:
- Pegue suas coisas e dê o fora daqui. Está demitida.

O jornalista passou os últimos quatro dias encabeçado nessa questão. Catarina saía mais do que ficava junto dele. De vez em quando levava Sofia, de vez em quando ia sozinha. Provavelmente para fofocar com a amiga que arrumou aqui; Denise. Voltava sempre com um sorriso disfarçado no rosto, mas isso não o incomodava nem um pouco. O porta jóias era o mais importante.
- O que está fazendo pai?
Sofia dessa vez ficou em casa e preferiu não sair com sua mãe, desejando passar um tempo com o seu pai. Paulo estava pesquisando arduamente na internet sobre alguma coisa que o pudesse ajudar a entender essa complicação. Munido também de vários livros de contextos orientais.
- Só fazendo uma pesquisa, querida.
Sofia tosse forte, tirando a atenção de Paulo em sua pesquisa.
- Tem tossido muito nesses dias filhota, sua mãe te levou para o Dr. Maycon examinar para saber o que é?
- Ela levou antes de ontem quando foi na casa deles.
Paulo resolve dar um pouco de atenção para a sua filha. Viu que já estava ficando obcecado por esse assunto e esquecendo de seu bem mais precioso. Coloca-a em seu colo e beija seu rosto.
- O que tem de legal lá? Pelo que vi é muito espaçoso.
A garota demonstrava um mísero interesse nesse tópico, mas já que foi perguntada, responde:
- Lá é bem espaçoso, que nem a nossa casa no Rio, mas é muito chato ficar lá.
- Por quê?
- Ah, eles não tem nenhuma criança da minha idade, apenas uma sala de jogos espaçosa. Às vezes minha mãe some com o Dr. Maycon e fica a Denise comigo. Tem vezes que a Denise some com minha mãe e fica o Dr. Maycon comigo. E tem vezes que os três somem e me deixam brincando sozinha no salão de jogos.
Paulo franze o cenho, completamente inconformado com essa história absurda. Como Catarina seria tão irresponsável em deixar a filha sozinha, e sempre sumindo com um dos donos ou até mesmo com os dois. Não queria pensar besteira, mesmo nem imaginando do que seja realmente o caso. Iria ter uma conversa bem demorada com ela, quando chegasse.
O homem repensa e decide que não vai esperar pela mulher, irá até onde a dita cuja se encontra. Pede que sua filhota se arrume, pois tirará essa história a limpo. Os dois pegam um táxi e encabeçam a partida para a casa do dr. Maycon.
Enquanto as ruas voavam pelas janelas do automóvel de tempo alugável, o jornalista e sua filha admiravam a paisagem bonita que esse estado tem a oferecer.
Enfim chegam a tão esperada casa. Que na verdade era um casarão. Os seguranças da família Pinheiros, que já conheciam e gostavam da linda Sofia os deixam entrar e os levam para dentro da mansão.
Plenamente acomodados, os empregados da família levam-nos para a cozinha e servem à adorada Sofia com sorvete de passas. Paulo via o contentamento de sua filha ao degustar dessa iguaria gelada, entretanto estava incomodado pela ausência dos donos da casa e de sua própria mulher. Tinha que investigar.
- Onde posso encontrar o banheiro?
- Siga o corredor lateral e vire a esquerda. É próximo as escadas que levam aos quartos.
Quartos. Essa era a palavra mágica que queria escutar. Agradece a informação que a cozinheira forneceu-lhe e deixa sua filhota aos cuidados dessa mulher. Tinha que tirar suas dúvidas maçantes.
Sorrateiramente sobe as escadas sem que ninguém o veja. Queria saber como eram a família Pinheiros pelos objetos que portavam no quarto. Leu um artigo que expunha que os objetos íntimos, do quarto precisamente, demonstram uma grande parte da personalidade de uma pessoa ou casal. Sabendo se é uma pessoa ou casal organizado ou não, e assim por diante.
Tudo parecia normal. Vários porta retratos com fotografias do casal e de alguns familiares e amigos, quem sabe. Olha debaixo da cama e vê pantufas e algumas poeiras. Provavelmente as faxineiras ainda não limparam por hoje. Apenas descobriu um “brinquedo” cilíndrico que algumas mulheres usam em si mesmas, mas nada que seja fora do normal já que Paulo não encara esse tipo de coisa como falta de moral. Seria hipócrita, falso moralista se achasse isso.
O homem levanta-se exausto, completamente inconformado em não achar nada no quarto. Até mesmo os donos e sua própria mulher que deveriam estar na mansão, mas não se encontram. Segue para a estante e verifica os livros que eles tinham. Constata que o gosto literário deles é mais para o estilo clássico. Nenhum autor contemporâneo fazia parte de sua miscelânea. Porta em mãos Ulisses, de James Joyce. Um livro antigo e de capa interessante. Muito bom, lembra de ter lido duas vezes.
Devolve-o a seu lugar, até o final da brecha. Fica cismado, pois ao colocar o livro fez com que a capa dura se chocasse com a madeira da estante, provocando um som oco. Retira o livro novamente e bate na madeira para constatar. Certamente era um som oco.
Coloca sua atenção na estante e a vê em todos os cantos. Estranha, pois vê uma fenda estranha por detrás do objeto. Determinado, começa a empurrar a estante e nisso escuta um estalo de algo se rompendo, descobrindo uma coisa interessante também. Havia uma passagem secreta ali...
Sem pensar duas vezes ele entra e vê uma maçaneta nas costas da estante. Servia para fechar e abrir o lacre que Paulo forçosamente rompeu. Havia uma escadaria que levava até o sótão e cautelosamente para não fazer muito barulho, ele sobe a escada.
Paulo presencia a coisa mais grotesca que seus olhos já viram. Arrepiasse com a visão do inferno na Terra. Era uma orgia satânica com intenções sado e maso. Catarina e os donos da casa, cujo eram o centro dessa perversão asquerosa ficam surpresos com a aparição repentina de Paulo. Catarina tenta aproximar-se para tentar explicar, mas horrendamente enojado Paulo some dali, carregando sua filha consigo.

Anoitece. Sofia coloca o travesseiro na cabeça para tentar dormir, entretanto falha nesse objetivo. Desde que sua mãe retornou da casa dos Pinheiros ela e seu pai discutiam incessantemente. Queria muito que isso acabasse...
- Como pôde Catarina...?
- Como pude?! Do mesmo modo que você transou com aquela modelo piranha! Não venha se fazer de inocente, pois você também me traiu!
Paulo abre os braços, tentando se segurar e fala:
- Quer comparar agora? Você me traiu primeiro e muitas vezes, sendo que eu fui apenas uma vez. Deixava sua filha a Deus dará e fazia aquela... – era difícil dizer algo na qual o enoja – coisa...
- Não venha dar uma de puritano Paulo, você tinha diversos vídeos desse gênero. Negue isso.
Paulo não estava acreditando na discussão que estava tendo com sua mulher. Totalmente inaceitável.
- Está percebendo o que está dizendo mulher?!
- Sim eu não sou surda seu babaca!
Irritado Paulo se controla para não voar nela e matá-la. Estava num ataque de nervos. Pega sua bolsa e tentando esfriar a cabeça para não fazer uma burrice, ele diz:
- Vou sair para esfriar a cabeça, pois estou quase enlouquecendo de ódio.
Então o jornalista segue para a saída, mas Catarina não deixa barato e o segue até a porta, mesmo depois de ele cruzá-la.
- Isso é só desculpa para ir transar com aquela vagabunda! Pelo menos eles fingem que me amam. Não preciso mais de você.
Paulo não olha para trás, pois estava prestes a estourar de ódio. Apenas caminha mais rápido que antes.

Em seu quarto Sofia chorava copiosamente, sendo interrompida pelas suas tosses crônicas...

Minutos mais tarde ele pára no mesmo restaurante do de hoje de manhã e pede uma vodca para aliviar a tensão. Sua cabeça iria explodir se não fizesse nada para se acalmar. Molha a garganta com a bebida e pede outra rodada.
Enquanto espera pela outra vodca ele tira o porta jóias da bolsa que carregou antes de sair de casa. Olha decidido para esse artefato adornado e coloca-se a matutar. Crê veemente que esse objeto maldito atende seus desejos e estava propenso a fazer um. Quer tornar o pensamento de sua mulher em realidade.
Bebe a outra rodada, paga a conta e sai para o seu destino...
Paulo estava em frente ao hotel em que Heloísa estava hospedada. Iria fazer exatamente o que sua esposa já pensava que ele iria fazer.
Com o porta jóias em mãos ele o abre e a melodiosa música começa a tocar. Nisso, ele segue todos os passos requeridos.
- Quero que Heloísa esteja com muita saudade de mim.
Instantaneamente seu celular começa a tocar. Olha no visor e vê que era um número que ele não conhece. Sem muito o celular para de tocar. Sem hesitar Paulo liga para o número da chamada perdida. Espera com paciência, pois parece que quem o ligou não queria atender. Depois de muito tempo a pessoa atende numa voz chorosa:
- Me perdoe Paulo, sei que prometemos não nos ver mais é que... Estou tão sozinha... - Heloísa começa a chorar sentidamente. O próprio Paulo sente-se culpado em envolvê-la em toda essa confusão – Esqueça Paulo, é que estou numa depressão horrível e... Não devo te preocupar com minhas besteiras, até logo...
- Espere! – exclama Paulo, conseguindo mantê-la na linha – Estou aqui perto, então vou dar uma passada aí. Não se preocupe, não vou demorar muito.
Sem mais o Sr. Ferreira entra no hotel...

Com o sol ostentado no céu Paulo sai do hotel sentindo-se pior que antes. Deixou Heloísa em depressão por causa dos seus egoístas desejos ao porta jóias maldito. Apenas aumentou o ódio maçante que estava sentindo dos Pinheiros. Eles é que arruinaram a sua vida!
Movido pela cólera ele chega ao hotel em que estava hospedado e pega a sua arma pessoal, saindo logo em seguida.
Sofia tentou alcançá-lo, mas sua tosse não a deixava prosseguir. Cobre a boca para tentar abafar o som alto de seu ataque, é quando sente algo quente em sua mão, escorrendo até seu pulso. Era sangue...!

Paulo não tem muita dificuldade em se infiltrar na mansão dos Pinheiros. Os empregados provavelmente não sabiam ou fingiam não saber o que ocorreu em relação a ele. O jornalista segue para o quarto do casal e como esperava eles não estavam lá. Passa pela passagem secreta e os encontram deitados na cama da devassidão. Dormindo em seus lençóis cobertos em luxuria onde perverteram todas as morais. Sem hesitar, o jornalista executa dois tiros, um em cada. Fica satisfeito em ver o sangue manchar os lençóis.
Para o seu desespero vê Maycon sair apavorado do que é provavelmente o banheiro.
- O que foi que você fez?! – exclama o médico –
Ainda não acreditando em seus olhos Paulo vai até a cama para constatar de quem são os corpos. Ao tirar o lençol sente um tremendo remorso. Era Catarina, sua esposa e mãe de sua filha, já sem vida. Estava furioso com ela, mas não ao ponto de querer matá-la. Lágrimas de lamentação escoam pelos seus olhos.
- Seu desgraçado!
Bang! A sua arma dispara em reflexo a investida de Maycon contra ele. Foi um tiro certeiro que atingiu a boca do médico, derrubando-o no ato. Paulo constata e vê que ele está morto. Como sua esposa e Denise. Desaba no chão, inconformado. Não acredita no que acabou de fazer. Nervoso, joga sua bolsa pro outro lado e de dentro dela sai o porta jóias, rolando pelo chão.
Impressionantemente o artefato fica em sua posição original e lentamente a tampa se abre, ressoando a música de sempre. É quando Paulo percebe os movimentos no casarão, que estavam agitados. Desse lugar secreto dava para escutar nitidamente o que ocorria no lado de fora ou era o porta jóias que o estava favorecendo? Estava ciente que os empregados ouviram os tiros e que procuravam pelos indícios de tal incidente. Sem opção Paulo apela para o porta jóias e segue o ritual de sempre, fazendo seu pedido:
- Quero que Catarina volte à vida...
Estranhamente a melodia não pára e nem Catarina ressuscita. Provavelmente existiam alguns limites que o porta jóias não podia passar. Em prantos, o jornalista apela:
- Quero sair impune disso tudo...
Como mágica a melodia cessa, não ressoando mais pelo quarto. Paulo olha para trás e vê que a arma do crime estava na mão do assassinado Maycon. Certamente suas digitais foram removidas por causa do desejo, mas estava receoso em relação aos empregados. Subitamente escuta diversos disparos de arma de fogo que pareciam nunca acabar. Entretanto acaba; e com isso vem uma forte sensação em Paulo para ele sair de lá rapidamente. Movido por isso, ele segue sua intuição.
O Sr. Ferreira fica aterrorizado com a chacina. Todos os empregados da mansão estavam caídos em seus próprios sangues, que vazavam das perfurações que tinham pelo corpo. Perto de seus corpos havia diversas cápsulas de bala e vários pentes descarregados. Irá parecer que deu um surto em Maycon e ele saiu executando todos os que via pela frente. Horrorizado, pega o seu carro e sai dali o mais rápido que pode.

Chega ao hotel completamente transtornado. Todas aquelas pessoas inocentes morreram por sua culpa. Nesse instante queria abraçar a sua filha, pois ela era a única coisa que ainda o ligava a sua humanidade. Infelizmente o pesadelo estava apenas começando. Para o terror de sua alma sua amada preciosa filhota estava deitada em sua cama, cadavericamente pálida e com o rosto e o vestido coberto em sangue.
Não! Foi o único grito desesperado antes dele se atirar ao chão, próximo a sua princesinha. Tentava acordá-la, mas era tudo vão. A menina não mais pertencia ao mundo dos vivos.
Paulo queria morrer. Queria ir no lugar dela um milhão de vezes, mas a única coisa que podia fazer agora é chorar, chorar, chorar...
De repente uma melodia odiosa começa a tocar. Só de escutá-la a gengiva do jornalista sangrava de tanto que ele apertava seus dentes um contra o outro, em profunda cólera. Torna a olhar para a sua bolsa e inexplicavelmente o maldito porta jóias estava no meio do quarto, com a tampa aberta e ressoando a agora asquerosa música.
- Isso tudo é sua culpa...!
Com muita fúria ele pega o koto que dera de presente para a sua filha e começa a massacrar o porta jóias. Bate freneticamente até se sentir minimamente satisfeito. Ofegante, observa os pedaços do koto e do porta jóias esparramados pelo quarto.
Suando frio ele presencia todas as peças do artefato amaldiçoado se juntando e reconstruindo-se. Logo o porta jóias estava novo em folha, como se nada tivesse acontecido a ele.
Apavorado, Paulo estoura o objeto na parede e mais rápido que da primeira vez ele se reconstrói. A bizarrice continua, pois a parede começa a expiar sangue e deste formam-se letras chinesas, que logo se convertem numa frase em português:
- Não adianta escapar de seu destino. Irei persegui-lo até que morras e assim caçarei teus filhos, e os filhos de teus filhos...
Completamente desesperado e mentalmente frágil, Paulo vocifera, em prantos:
- Você já me matou e matou minha única filha!
Desorientado ele sai do quarto e tenta escapar desse lugar maldito. Entretanto o porta jóias sempre aparecia a sua frente. No saguão do hotel, na entrada do hotel, na piscina, na praia... As pessoas que o viam balançavam as cabeças, lamentando ter que presenciar esse louco correndo e fazendo baderna.
Corria pela orla da praia e sempre deparava com o objeto amaldiçoado bem à frente, repousado na areia. Sempre que o passava o porta jóias sempre aparecia à frente. Certamente atacou o pertence de T’an-mo diversas vezes no mar, mas não adiantava, dava sempre no mesmo.
Cansado de fugir pára bem próximo do artefato e fita-o com desespero. Vê que próximo dali tinha um pequeno barco pesqueiro. Sua mente deturpada só consegue pensar numa só solução. Pega o porta jóias e corre até o barco.
Rema para bem longe. Até onde não pudesse ver terras no horizonte. Decidido a destruir toda a sua culpa e mágoas. Ele atira-se no mar, com objeto nas mãos. Morrendo levando esse artefato maldito privará que pessoas inocentes se firam não sabendo utilizar esse poder demoníaco. Paulo caía como uma pedra, chegando cada vez mais fundo na imensidão azul. Uma enorme pressão se apossa em sua cabeça pela falta de oxigênio no corpo. Em seu momento de morte deseja que todas as pessoas ao qual feriu nessa ambição miserável possam o perdoar...

13 anos depois...
Duas crianças brincavam na parte rasa da praia. Optaram pelo pega-pega como fonte de diversão. O menino corria mais para o fundo, tentando escapar das garras de sua irmã gêmea:
- Vem pra cá Paulo, a mãe disse para não irmos para o fundo. - exclama a irmã, fazendo beiço -
O menino ri, divertindo-se nesse dia quente. Segue a ordem da chata da irmã e volta até a parte rasa. De repente o menino quase tropeça. Pisou em algo muito duro que quase o fez cair. Imaginando que seja uma pedra ele tenta retirá-la para jogar em um lugar seguro, pois alguém poderia se machucar como quase aconteceu com ele. Para a sua surpresa era uma caixa muito bonita. Estava novinha e sem nenhuma marca de oxidação.
O pai das crianças as vêem correndo freneticamente até ele e seu menino carregava algo reluzente em mãos.
- Olha pai o que o Paulo achou. - diz a irmã -
O pai analisa o pertence e logo chama a atenção de sua esposa, que tomava banho de sol tranquilamente.
- Dê uma olhada no que seu filho encontrou Heloísa.
A ex-top model tira seus óculos escuros e pega em mãos o objeto, logo vendo um nome gravado embaixo da caixa. "T'an-mo"...

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